sábado, 28 de fevereiro de 2004

O acidente do "Prestige" e suas consequências.

O acidente 
 Quarta-feira, 13 de Novembro de 2002.
       Quando o petroleiro “Prestige” carregado com 77 000 ton de um fuel de grande densidade, bastante sulfuroso e pouco solúvel, navegava rumo a Gibraltar, tendo Singapura como destino, passando 30 milhas a oeste do cabo Finisterra (Galiza) lança um pedido de socorro dado encontrar-se a adornar perigosamente. Após ter deambulado em várias direcções durante seis dias ao sabor das indecisões governamentais partiu-se ao meio a 200 milhas do referido cabo tendo-se afundado até aos 3500 metros de profundidade poucas horas depois.
       Estima-se que o navio, de 25 anos, proveniente da Lituânia (com bandeira das Bahamas, propriedade de um armador Grego e fretado por uma empresa anglo-suiça) terá lançado no mar cerca de 17 000 ton de fuel desde que sofreu o primeiro rombo no casco até que se afundou e mais 46 000 ton nos dias seguintes.
        A remoção das restantes 14 000 ton do interior do barco está prevista para a  primeira metade de 2004.
 
As marés-negras
        Desde o primeiro dia em que se deu o acidente e até meados de Janeiro de 2003 ocorreram quatro fortes marés-negras que afectaram as comunidades da Galiza, Corunha, Astúrias e Cantábria em Espanha assim como uma parte da costa francesa. Além destes episódios continuaram a ocorrer até ao Verão de 2003, provavelmente devido à limpeza clandestina de outros navios-tanque a passarem na zona, contaminações regulares de fuel especialmente sobre a costa asturiana e da Corunha impedindo o normal decurso da época balnear com o fecho temporário de uma ou outra praia e com veraneantes a serem atingidos na água com nafta.
         No global cerca de 70% das praias arenosas do norte de Espanha acabaram por ser afectadas embora com diferentes graus de gravidade.


A contaminação das aves marinhas
 
        Este grupo animal foi especialmente afectado com este acidente, como aliás sempre acontece em acidentes similares. Independentemente dos problemas gravíssimos produzidos pela ingestão directa de fuel, as aves ao serem atingidas com nafta na plumagem perdem a impermeabilização da mesma ficando diminuídas para poderem arranjar alimento e nadarem. É deste modo que doentes e fatigadas acabam por morrer.
        Neste acidente foram registadas um total de 23 181 aves afectadas (73.6% das quais já mortas), recolhidas ao longo da costa espanhola (84.2%), francesa (12.2%) e portuguesa (3.6%). Refira-se que os números apresentados devem ser sempre olhados como valores muito inferiores aos valores reais de aves afectadas estimando-se que estes últimos sejam 10 vezes superiores.
        Entre as mais de 90 espécies afectadas destaca-se claramente o arau-comum (Uria aalge) com 51% do total dos corpos seguido da torda-mergulhadeira (Alca torda) e do papagaio-do-mar (Fratercula artica) cada um com cerca de 17% do total. Entre as regiões com maiores números de aves recolhidas destacaram-se a Corunha e Pontevedra.
        A recuperação destas aves petroleadas foi desde logo uma das atitudes a tomar. No entanto, o sucesso desta medida traduziu-se numa taxa de sucesso de apenas 10% o que permite concluir sobre a verdadeira dimensão desta tragédia para as aves marinhas.


Outras contaminações
Relativamente a outros grupos animais e logo durante o mês seguinte ao afundamento do "Prestige" deram à costa galega 27 cetáceos pertencentes a 7 espécies diferentes e 16 tartarugas-marinhas pertencentes a 2 espécies. 

Um ano depois
        Segundo estudos realizados por investigadores espanhóis os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (substâncias cancerígenas) que existiam no fuel derramado começaram a entrar nas cadeias alimentares do oceano afectando sequencialmente os microorganismos microscópicos, o marisco, os peixes como o linguado  e o robalo e finalmente o homem. Contudo as conclusões do estudo referiam que os níveis de toxicidade não ultrapassavam os níveis limite.
         As costas espanholas afectadas bem como a costa portuguesa continuam contudo potencialmente ameaçadas por novos casos semelhantes. Na verdade dentro da nossa Zona Económica Exclusiva é frequente a passagem de navios-tanque, frequentemente obsoletos, fazendo transporte de hidrocarbonetos e de produtos químicos diversos, pelo que outras situações de risco se poderão criar em qualquer momento. Esta situação é tanto mais preocupante quanto o facto de não existir um controlo efectivo sobre as lavagens destes navios ao largo da costa e dentro da ZEE por falta de meios de patrulha navais e aéreos adequados.
        Outras dificuldades colocadas no combate a sinistros desta natureza têm a ver com o facto:
- do Centro Internacional de Luta contra a Poluição no Atlântico Nordeste (CILPAN) criado em 1990 pelo Acordo de Lisboa não funcionar na prática revelando-se como muito urgente a sua reestruturação;
- de não existirem os materiais e equipamentos de intervenção necessários, bem como, de um navio equipado para combate à poluição no mar;
- de não existir um sistema permanente de controlo de tráfego marítimo que permita afastar este tipo de navegação para lá das 20 milhas.