quinta-feira, 4 de maio de 2006

A propósito do Dia Mundial das Aves (9 de Maio) e do Dia Internacional para a Diversidade Biológica (22 de Maio)


       As aves desde sempre atraíram o homem, quer pelos seus voos majestosos, quer pelas suas plumagens atraentes, quer ainda pelos seus magníficos cantos. Contudo, a importância que as aves representam para os homens vai muito para além destas características primárias que as tornaram deste modo seres apetecíveis a uma convivência doméstica. 
       Perseguidas ilegalmente sempre que a sua dieta alimentar inclui espécies com interesse para o homem, perseguidas também ilegalmente sempre que sobre elas pendem crenças obscuras, ou perseguidas simplesmente porque pertencentes a um grupo de seres relativamente aos quais o abate é permitido por lei, as aves que não gozando do estatuto de «domésticas» e que por isso fazem parte da fauna selvagem têm vindo a sofrer fortes declínios populacionais um pouco por todo o mundo.
       
A importância das aves na agricultura e na silvicultura

        É conhecido de todos que quer os campos incultos quer os campos cultivados, as searas, as florestas, as hortas e os jardins são locais onde abundam para além de muitas sementes de ervas daninhas uma multidão de insectos. Ora, são estes dois elos orgânicos que constituem a base da dieta alimentar de um grande número de espécies de aves.
         Entre nós, os indivíduos adultos de várias espécies como os pombos-bravos, os pardais ou os tentilhões figuram entre as espécies granívoras, enquanto as formas juvenis destas mesmas espécies, as andorinhas, os andorinhões, os chapins e as toutinegras pertencem ao grupo dos consumidores de insectos.
Saindo fora das nossas fronteiras lembremo-nos da grande variedade de insectos existentes por todo o mundo, especialmente abundantes nos países tropicais e equatoriais (só na Índia já se encontraram mais de 30 000 espécies), bem como, a sua enorme capacidade reprodutora (um só casal numa única estação reprodutora pode chegar a produzir várias dezenas de milhar de descendentes) e a sua enorme voracidade (uma só larva pode ingerir por dia uma quantidade de carne duzentas vezes superior ao seu peso inicial). Além do mais, os insectos constituem frequentes pragas (as nuvens de gafanhotos, por exemplo, chegam a encobrir a luz do Sol destruindo em apenas algumas horas toda a vegetação existente numa extensão de vários quilómetros), conduzindo à destruição das culturas e das madeiras e a enormes prejuízos económicos, pelo que será difícil imaginar o sucesso da agricultura, bem como, a sanidade dos povoamentos florestais sem as aves insectívoras.
Por incrível que possa parecer, até pelas falsas ideias que proliferam entre algumas populações campesinas, que vêem nestas aves atributos malignos, as corujas, os mochos e as aves de rapina diurnas são igualmente um auxiliar precioso do agricultor na medida em que exercem um controlo muito apertado sobre as populações de roedores, os quais podem representar também sérias pragas em algumas regiões do globo.


Relação custo/benefício das aves

         As ideias expostas parecem não deixar dúvidas sobre o papel benéfico das aves na rentabilidade das actividades agrícolas e florestais humanas. Contudo, não deixa de ser também uma verdade que em certas regiões e durante determinados períodos de tempo pode ocorrer um excesso de indivíduos de uma dada espécie ornitológica (excesso de pardais ou de estorninhos, por exemplo) conduzindo a um desequilíbrio nos ecossistemas.
No entanto, será bom não esquecer que estes excessos a acontecerem devem-se ao facto de actualmente, com o intuito de se obterem mais alimentos, se praticarem monoculturas diversas (pinhais, eucaliptais, searas, monoculturas específicas) em vez do que seria ecologicamente sustentável que seria o fomento da diversidade de culturas, permitindo a ocorrência de diferentes nichos ecológicos (como por exemplo acontece com a floresta caducifólia). De facto, a monocultura intensiva ao disponibilizar um determinado tipo de alimento promove o rápido crescimento populacional de uma dada espécie de aves: a espécie melhor adaptada e mais competitiva por esse mesmo alimento. 
Se a abordagem feita sobre o papel das aves terrestres na economia humana se revela de um interesse particular, o papel das aves marinhas e aquáticas no equilíbrio dos recursos pesqueiros oceânicos e lagunares é igualmente significativo. Gansos-patolas, tordas-mergulheiras e airos são algumas das espécies que no mar são responsáveis pelo controlo das populações de peixes enquanto garças, maçaricos, patos e galeirões cumprem as suas funções reguladoras nos ecossistemas de água doce.
A exploração intensiva de determinadas espécies piscívoras (espécies com valor comercial) conduz não só à redução destes stocks, como também, à redução de determinadas populações de aves que delas se alimentam. Em compensação, assiste-se ao crescimento de outras populações de aves, mais competitivas face às espécies piscívoras menos capturadas, conduzindo mais uma vez a desequilíbrios nos ecossistemas.

Assim, poder-se-à afirmar em termos conclusivos e no sentido de reconhecer às aves o seu importante papel na conservação dos ecossistemas humanos, que é absolutamente crucial que se proceda a investigações cuidadas sobre as mesmas e sua ecologia, de modo a esbaterem-se de forma conveniente os conflitos entre as aves consideradas «nossas aliadas» e as aves consideradas «nossas inimigas».

(Artigo publicado a 25.05.06 no Jornal de Ovar)