domingo, 28 de dezembro de 2008

Seja bem-vindo o Decreto-Lei n.º 142/2008! (II parte)


Tal como referido na primeira parte deste artigo, um dos dois documentos entregues na Câmara Municipal de Ovar no passado dia dezanove de Novembro, consistia numa versão provisória da constituição da Reserva Natural da Barrinha de Esmoriz, proposta pelo Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem (NPEPVS) e subscrita pela associação ambientalista de Esmoriz Palheiro Amarelo.
A Barrinha de Esmoriz (ou Lagoa de Paramos, para os espinhenses) constitui uma lagoa costeira cuja superfície, com 396 ha, está dividida entre os concelhos de Ovar e Espinho. Este acidente geográfico, incluído na Reserva Ecológica Nacional, integra a Lista de Sítios da Rede Natura 2000 e é considerado uma Área Importante para as Aves (IBA). Tais estatutos advêm do facto de na Barrinha existir uma grande diversidade de espécies florísticas (80 espécies identificadas) e uma não menos importante ocorrência de aves selvagens (mais de 270 espécies), algumas com estatutos de grande vulnerabilidade e por conseguinte de conservação prioritária, nos termos da Directiva comunitária 79/409/CEE (conhecida como Directiva das Aves).
Rodeada a norte pelo aeródromo de Paramos, a nascente e a sul por uma ténue cortina arbórea e arbustiva que a separam das habitações muito próximas e a poente pelo cordão dunar muito degradado, a Barrinha é envolvida por uma significativa mancha de caniçal, imprescindível como local de abrigo e de reprodução para as aves selvagens.
Dada a sua localização, esta Zona Húmida do norte de Portugal, representa uma etapa fundamental na migração dos passeriformes e das aves aquáticas. Entre as espécies de aves aqui observadas e dignas de registo especial destacam-se a águia-sapeira (Circus aeruginosus), com um status de grande vulnerabilidade e o flamingo-rosado (Phoenicopterus roseus), espécie observada uma única vez no local. Contudo, são os anatídeos e os ardeídeos que predominam neste espaço litoral, com a zona dunar a ser aproveitada para a nidificação do Borrelho-de-coleira-interrompida (Charadrius alexandrinus). Entre as espécies da flora da Barrinha destaca-se o endemismo Jasione lusitanica.
Têm sido diversos os factores que têm ameaçado esta lagoa costeira. A implantação de urbanizações e de um campo de golfe muito próximos da lagoa, a perturbação produzida pela passagem de aeronaves sobre a Barrinha (com o recente aumento da extensão da pista), o excessivo pisoteio das dunas e a poluição das suas águas, provocada pelos efluentes industriais e domésticos que chegam pela Ribeira de Rio Maior e pela Vala de Maceda que nela desaguam (esta poluição chega também de fontes distantes, como as que estão localizadas no concelho de Santa Maria da Feira) têm sido as principais ameaças à conservação deste espaço natural.
A Barrinha de Esmoriz constitui, assim, um pequeno mas importante ecossistema natural, cujo potencial só poderá ser maximizado se for respeitada a sua dinâmica natural, evitando-se intervenções desajustadas no meio ambiente, sobretudo durante a época de nidificação. Este ecossistema é considerado, também, de conservação prioritária pela Directiva Comunitária 92/43/CEE (conhecida como Directiva Habitats, a qual foi transposta para o Direito português pelo D.L. nº 140/99, de 24 de Abril).
Para salvaguardar a fauna, a flora e a paisagem desta Zona Húmida o Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem, na década de 70 e a Quercus, na década de 90, avançaram com ante-projectos de criação de uma Reserva Natural, os quais nunca tiveram concretização legal. Acontece que, em 24 de Julho do corrente ano foi publicado o Decreto-lei nº 142/2008, que estabelece o regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade, abrindo a possibilidade dos Executivos Municipais proporem a criação das suas áreas protegidas.
Pois é isso que agora o Núcleo Português de Estudo e Protecção da Vida Selvagem (NPEPVS) em conjunto com a associação esmorizense Palheiro Amarelo pretendem, ou seja, dotar esta Zona Húmida com um estatuto de protecção da natureza, no quadro do referido regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade (Decreto-lei n.º 142/2008, de 24 de Julho) e integrá-la na Rede Nacional de Áreas Protegidas.


(Artigo publicado no Jornal de Ovar de 24/12/08)

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Mais pedra para quê?


Para erodir ainda mais a linha de costa a sotamar dos esporões e dos enrocamentos? (repare-se na imagem do sul do Furadouro)
Ou será para alimentar os lobbies envolvidos nesta negociata das pedras?

Aquilo de que a costa portuguesa precisa, na realidade, é ... AREIA. Ou então, em alternativa (essa sim económicamente mais vantajosa), que não a ocupem!
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Artigo no Jornal Público de 16/12/08:
Especialista em zonas costeiras contesta utilidade da "colocação de mais pedregulhos" no litoral de Ovar
Sara Dias Oliveira

A As obras de defesa da costa de Ovar já arrancaram com o objectivo de reparar seis esporões a norte e a sul das praias de Esmoriz, Cortegaça e Furadouro. As reparações das defesas entre o esporão norte de Esmoriz e o esporão norte de Cortegaça, numa extensão de dois quilómetros, e a sul do esporão sul do Furadouro, ao longo de 100 metros, estão também nos planos da empreitada que está a cargo do Instituto Nacional da Água. As máquinas estarão no terreno durante 15 meses e o investimento ronda os cinco milhões de euros, mas a obra não é pacífica. Álvaro Reis, mestre em zonas costeiras e residente em Ovar, defende que o combate à erosão passa por injectar areia nas praias e não por colocar mais pedra na costa vareira. "Estou bastante preocupado com as obras. É mais do mesmo, reparar e manter as obras em pedra, o que é errado", afirma. "Na minha opinião, a alimentação das praias com areia, que se poderia ir buscar a vários locais das zonas portuárias, seria a solução", acrescenta. Retirar alguma areia ao mar, bem junto à praia, é também um dos caminhos que aconselha. "A obra que vai ser feita, ao longo desse troço da costa de Ovar, é em tudo semelhante ao que já foi executado, é voltar a colocar pedregulhos sob a forma de esporões", constata o ambientalista ligado à Quercus. Álvaro Reis, autor de vários livros sobre o avanço do mar e a protecção das zonas litorais, como A Praia dos Tubarões - Ordenamento e Gestão da Orla Costeira, avisa que é necessário seguir um de dois trajectos: "Ou as pessoas têm a coragem de, de uma vez por todas, abandonar o litoral e deixar o mar subir e avançar, ou defende-se esse território e coloca-se o que lá faz falta, ou seja, areia". O presidente da Câmara de Ovar, Manuel Oliveira, está satisfeito com o arranque da empreitada, mas recusa pronunciar-se sobre a opção técnica. "Não gosto de teorizar sobre questões que desconheço. Para nós, o que é importante é que a resposta, seja ela qual for, seja eficaz." "Para já, interessa-nos salvaguardar e acautelar a segurança de pessoas e bens", reforça. O autarca garante que a obra de defesa da costa "é prioritária" e lembra que tem vindo a ser reclamada há bastante tempo pela câmara.