Estamos em plena Primavera!
De um pequeno veio de água cristalina, surgido nos píncaros mais altos da montanha e que, entretanto foi engrossando, ora, com as águas das chuvas, ora, com as neves derretidas, formou-se o riacho que daqui a alguns quilómetros se chamará rio.
Caindo a pequenos saltos, de rocha em rocha ...
... o riacho não leva rumo fixo, bem pelo contrário.
Esgueirando-se por entre as fendas que encontra e amparado pelas rochas de maiores dimensões, o seu pequeno caudal ziguezagueante não deixa de representar um convite à fixação de pequenos seres invertebrados e de se constituir bebedouro para outros tantos vertebrados da alta montanha.
O alfaiate (Gerris lacustris) é abundante à superfície destas frias águas correntes. Sendo uma espécie predadora, a sua presença indica haver uma grande disponibilidade alimentar de outros insectos e larvas submersas.
Também é junto ao riacho que vive o lindíssimo lagarto-de-água (Lacerta schreiberi), outro predador de invertebrados, como escaravelhos, mosquitos, moscas, formigas, aranhas, gafanhotos e larvas de borboletas.
Com um corpo esverdeado, sarapintado de negro, uma garganta de tonalidade azulada e uma cauda compridíssima, que pode atingir o dobro do comprimento da cabeça e corpo juntos, o lagarto-de-água é uma verdadeira jóia da natureza.
Gastar algum tempo a admirar os seus movimentos compassados, frequentemente interrompidos por posturas de alerta, constitui momentos de enorme encanto e comunhão com a natureza selvagem.
Imbuído por estes momentos contemplativos, a que o marulhar da água nas rochas dá um importante contributo, sou chamado à realidade envolvente, pelo chamamento da simpática cia (Emberiza cia), atarefada na procura de sementes, bagas e também insectos.
Não é de estranhar que, a dada altura do seu percurso, este caudal de águas cristalinas que entretanto já engrossou, correndo agora em turbilhão, caia desamparado nalguma vertigem do abismo, que a serra é pródiga em criar.
Já nas profundezas do vale, e com a ajuda de outros pequenos ribeiros que se lhe juntaram, o rio apresenta, então, uma maior corpulência de caudal e um rumo mais esclarecido, com um serpenteio muito mais amplo e espaçado, imposto pela orografia do terreno.
Estas águas furiosas, repetem o percurso de muitas outras, que ao longo de milhares de anos, escavaram o vale. Saltando por entre grandes blocos de rocha, originam zonas de grande turbulência ...
... a que sucedem zonas de acalmia .
O meio líquido formando mais de metade da composição celular dos seres vivos é indispensável, tal como o ar, para a garantia da vida!
Agora não são apenas insectos e pequenos organismos subaquáticos que nele pululam. Diversas espécies piscícolas, como o bordalo (Squalius alburnoides), a boga (Chondrostoma sp.), a truta-de-rio (Salmo trutta) e o escalo-do-norte (Squalius carolitertii), constituem a base da alimentação de alguns outros vertebrados.
Entre os mamíferos que vivem nas proximidades do rio, há uma espécie que consegue explorar, na perfeição, as fortes correntes e turbilhões destes troços fluviais. Trata-se da lontra (Lutra lutra).
Com um corpo fusiforme, uma pelagem isolante, patas palmadas e dedos ligados por membrana interdigital, a lontra é outra obra-prima da evolução animal, em que as excelentes adaptações ao meio aquático foram alcançadas integralmente.
Lindo bicho, este!
(continua)
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