sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Ecos do silêncio (IV)

 




(continuação)


O calor abafado que se faz sentir no interior do pinhal fomenta não só a indolência, como também, ajuda a difundir os aromas exalados pelas folhas rugosas do sanganho-mouro (Cistus salviifolius).



Inebriado pelos aromas do pinhal, o olhar perscrutador dirige-se para os pequenos subarbustos, que mais se assemelham a buquês floridos de rosa-púrpura, e que, imprimindo uma tal graciosidade a estes areais, fazem com que todos os que se vislumbram em redor não cansem a vista pela repetição. Falamos da singela mas resistente urze (Calluna vulgaris).



Menos expostas, porque rodeadas pelo extenso tojal, mas igualmente deslumbrantes pelas suas frondosas e decoradas ramagens, encontram-se as  camarinheiras (Corema album). 

Este lindíssimo e endémico arbusto da Ibéria, ornamentado por uma multidão de redondinhos frutos brancos, faz parte das memórias das gerações litorais mais antigas, quando a distribuição da espécie era muito mais abrangente do que é hoje e todos os recursos do pinhal, como lenha, pinhas, resina, frutos, ... eram sabiamente aproveitados e geridos. Tempos idos!





O sol declinou sobre o horizonte, o suficiente para refrescar o ar. Chegou, então, o momento de abandonarmos o remanso da sombra, descalçarmo-nos e sentirmos o doce prazer de enterrar os dedos dos pés na fofa areia do trilho.

Com o abaixamento da temperatura, os aromas do pinhal intensificaram-se e consequentemente aumentou o prazer olfactivo!



Durante a caminhada vamos tendo a oportunidade de nos acercarmos das plantas do pinhal. Agachando-nos, conseguimos apreciá-las com maior detalhe, com maior intimidade. 


O amarelo vibrante das corolas do tojo, além da beleza que oferece ao olhar, constitui também um mecanismo de atracção para os insectos melíferos. Estes, na sua labuta de recolha de pólen acabam por realizar o transporte do mesmo dentro e fora da própria planta. 



Neste pinhal de silêncios, a beleza dos pequenos seres torna-se gritante. 

Colocada no centro da sua teia, uma aranha-de-cruz (Araneus diadematus) termina calmamente o seu repasto.



Quase ao lado, encontra-se uma maternidade babosa, onde as larvas de cigarrinha-do-prado (Philaenus spumarius) se transformarão brevemente em formas adultas.




As pequeninas e púrpuras corolas da queiró (Erica umbellata), olhadas bem de perto, apresentam-se como um dos infindáveis exemplos da plasticidade presente em todas as obras da Criação.



Abandonamos momentaneamente o trilho para melhor apreciarmos a pérola do Atlântico, como alguns a apelidam. Ao fazê-lo, damos com um coelho (Oryctolagus cuniculus) a alimentar-se plàcidamente das ervas presentes no pinhal.



As esféricas camarinhas, de um branco, que por vezes é sujo e outras vezes de laivos rosados, despontam sobre os segmentos superiores dos ramos do arbusto. Com propriedades medicinais e sabor agradável servem de alimento aos animais do pinhal, como pássaros, roedores e coelhos, os quais através das fezes procedem ao transporte das suas sementes.



Esta planta, para além dos frutos que produz, tem uma redobrada importância pelo seu papel como pioneira aquando da sucessão ecológica em áreas degradadas e ainda como um importante fixador das areias litorais.


(continua)


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