domingo, 17 de setembro de 2006

A propósito do Dia Mundial do Habitat



         2 de Outubro de 2006, Dia Mundial do Habitat. Um dia especialmente dedicado à preservação do “lugar” onde habita uma dada espécie; do lugar onde os organismos de cada espécie animal ou vegetal vivem, quer sob a forma de comunidade quer sob a forma de população. Caniçais, dunas costeiras ou escarpas de ilhas oceânicas são apenas três dos variadíssimos espaços existentes no planeta Terra, onde conjuntos determinados de organismos vivos precisam impreterivelmente de assentar “lugar”. Organismos esses que nestes três casos específicos poderiam bem ser, por exemplo e respectivamente por sequência, a garça-vermelha, o estorno e o airo-comum.
         2 de Outubro de 2006, um dia que servirá, então, para uma reflexão profunda sobre as estratégias usadas ou a usar de modo a conseguir-se fazer a conservação dos espaços biofísicos do planeta e consequentemente a conservação das espécies que os ocupam; um dia que servirá contudo, noutros casos, para finalmente dar ‘o primeiro passo em frente’ na adopção de uma política de ambiente ou para, pelo contrário, abandonar metodologias de inércia e inconsequentes.
          2 de Outubro de 2006. Neste dia, reflectir em Portugal sobre a importância dos ‘habitats’ é, por exemplo, comemorar os 25 anos de trabalho em prol da preservação do arquipélago das Berlengas (a Reserva Natural das Berlengas), um espaço biofísico tão importante para as aves marinhas e cuja conservação tem sido possível graças a um trabalho de parceria levado a cabo entre o Instituto de Conservação da Natureza e a Câmara Municipal de Peniche.
          2 de Outubro de 2006. Neste dia, reflectir em Portugal sobre a importância dos ‘habitats’ é, por exemplo, rejubilar perante iniciativas autárquicas em prol do ambiente, como as da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, que entre outras, criou o Parque de Dunas da Aguda, numa estratégia de educação e de protecção dos habitats costeiros e das espécies que neles vivem.
          2 de Outubro de 2006. Neste dia, reflectir em Portugal sobre a importância dos ‘habitats’ é, por exemplo, lamentar a falta de iniciativa da Câmara Municipal de Ovar em levar por diante a valorização e conservação da zona lagunar do concelho (repleta de habitats), nomeadamente ao virar as costas ao projecto de criação de uma área protegida.

         ‘Habitat’, uma só palavra mas plena de conteúdo, pois encerra em si todo um conjunto, muito diverso, de condições ecológicas características do local ocupado por uma dada espécie. E é importante referir que ao falar de ‘espécie’ não se deve reduzir este conceito somente aos animais inferiores ou às plantas; pelo contrário, o conceito tem a ver também connosco, ele é inerente ao homem, como espécie entre as demais. Assim, a cidade ou a aldeia, o bairro A ou o bairro B, a casa rural ou o apartamento urbano, etc, constituem também eles exemplos de ‘habitats’.
         Habitats humanos, que cada um de nós procura preservar, porque deles depende para viver, tal e qual como acontece no mundo dos seres vivos inferiores; vida essa que cada um de nós pretende levar com a máxima qualidade possível, tal como de forma instintiva, o fazem os seres vivos inferiores.
         Habitats humanos que, contudo e frequentemente podem ver-se ameaçados, tal como acontece no mundo das espécies irracionais e inconscientes; ameaçados, por exemplo, por factores ecológicos naturais incontornáveis, como seja, o avanço das águas do mar sobre a faixa costeira.
          Deste modo e neste dia, reflectir em Portugal sobre a importância dos ‘habitats’ passará também e obrigatoriamente por um esforço em tentar compreender as razões incongruentes assumidas pelas instituições governamentais a diferentes níveis, quando são capazes de demonstrar total insensibilidade perante a segurança dos ‘habitats’ humanos, que o mesmo quer dizer, perante a segurança de pessoas e bens (como exemplo, atente-se na extraordinária demora experimentada no realojamento dos moradores do bairro piscatório de Esmoriz, um ‘habitat’ indubitavelmente de alto risco).
          
           2 de Outubro de 2006. Face aos casos apresentados, reflectir em Portugal neste dia, sobre a importância dos ‘habitats’ deverá ser também uma ocasião para uma auto-análise por parte dos gestores ambientais no que respeita ao desempenho das suas funções. Uma auto-análise e uma auto-crítica, que em alguns casos deveriam conduzir à abdicação de cargos, sempre que a falta de vocação para a gestão ambiental se torne por demais evidente.


 (Artigo publicado a 05.10.06 no Jornal de Ovar)

sexta-feira, 1 de setembro de 2006

A propósito do Dia Internacional da Limpeza das Praias


Por certo que, na mente ou nas mentes de quem idealizou um dia especialmente dedicado a esta temática, não estaria, como objectivo principal do mesmo, fazerem-se ouvir meras declarações públicas institucionais, o anúncio de um conjunto mais ou menos elaborado de boas intenções inconsequentes ou até mesmo a demonstração pública de uma qualquer coreografia realizada à beira-mar. Creio não errar ao afirmar que, em vez disso, se pretenderá com esta comemoração definir um conjunto, mesmo que simples, de intervenções a serem efectivamente levadas à prática, no sentido de se melhorar a qualidade das areias e da água das praias em todo o mundo.
Mundo esse onde estamos nós. Nós, habitantes de Portugal e concretamente do concelho de Ovar. Nós, juntamente com os nossos representantes do Poder Local, escolhidos como os melhores para servirem o Bem Público da nossa terra. Contudo, a realidade deixa de ser o que deveria ser, para ser aquilo que infelizmente é. E então, o que constatamos nós, ovarenses?
Todos os anos ao abrir oficialmente a época balnear e em plena praia soam de forma desconcertante discursos, com pompa e circunstância, proferidos por responsáveis – os senhores das praias - enquanto Bandeiras Azuis são hasteadas ao som das palmas inocentes batidas pelos meninos e meninas que para lá são conduzidos, com o intuito de dar cor e moldura ao cenário. Fotografias, reportagens na imprensa, muitos registos para a posteridade. Tudo muito bonito, obra feita têm a descaradez de dizer alguns, mas... o lixo ou as descargas de águas sujas provenientes da Barrinha de Esmoriz, parecem ser a partir dessa mesma data condição sine qua non para se manter a tradição, que o mesmo é dizer, o cartaz turístico vareiro oferecido em pleno período de veraneio.
E este cartaz turístico é uma chatice. Uma chatice, pois os efluentes acabam por ficar muitos dias nas praias do concelho, mais ou menos diluídos, com mais ou menos coliformes fecais, mas sempre, sempre, a colocarem em risco a saúde das pessoas e a contaminarem as praias.
        Mas a seguir vem o pior. Pois, se entretanto e perante tal cenário há alguma alma deste rincão português que clama com motivos mais do que justos que a água do mar cheira mal ou que a areia da praia está suja, ouve-se invariavelmente da parte dos responsáveis, que são acusações injustas, que não é da responsabilidade deles, que não têm competências, que a culpa é de desconhecidos, blá, blá, blá, ... blá, blá, blá. Isto acontece porque simplesmente estes “senhores das praias” se “esqueceram” de que poluição das praias constitui um problema de saúde pública e não um obstáculo político-partidário a contornar. “Esqueceram-se” estes senhores que, saúde pública e qualidade do ambiente constituem assuntos com os quais, certamente, se comprometeram quando assumiram os respectivos cargos.
Ninguém pede que os problemas das praias se resolvam todos, do dia para a noite. Mas nada justifica que, alertados para os diferentes problemas ambientais associados à qualidade das praias, os responsáveis queiram arrastar eternamente, ano após ano, o adiar de soluções, culpabilizando terceiros sempre que um acidente ambiental acontece, como seja a abertura extemporânea da Barrinha de Esmoriz.

Seria bom, de facto, que os responsáveis pelas praias do concelho de Ovar fizessem o favor (leia-se antes, o dever) de no próximo ano falarem de qualidade das praias, associando a este conceito a exposição da dita Bandeira Azul, somente quando diariamente houver a certeza de que os parâmetros mais sumários (cor, aspecto e cheiro) das águas do mar estiverem em conformidade. É necessário ter a honestidade de arriar a Bandeira Azul e manter hasteada a Bandeira Vermelha sempre que se constatar que a água do mar se encontra suja ou de aspecto duvidoso.
A terminar este artigo dedicado ao Dia Internacional da Limpeza das Praias, assinalado no próximo dia 22 do corrente mês, lembro, que já decorreu tempo mais do que suficiente e acidentes ambientais mais do que numerosos na costa ovarense para que se tivesse tido a iniciativa de reduzir o intervalo de tempo que medeia a recolha de amostras nas praias do concelho, aumentando, assim, a confiança nos resultados oferecidos aos utentes destas praias tão permeáveis a factores ambientais negativos.

 (Artigo publicado 07.09.06 no Jornal de Ovar)