segunda-feira, 20 de março de 2023

A Primavera está aí ...

 




Este ano, o desabrochar da natureza, após o rigoroso Inverno que agora termina, parece revelar algum atraso face ao que se verificou em anos anteriores. E isto é notório em diferentes habitats.

Nas matas, por exemplo, no início do corrente mês era (e ainda é hoje) bem menor a mancha amarela de tojo-arnal (Ulex europaeus), indiciadora de um atraso temporal de cerca de um mês na floração.


07.03.21
07.03.21


Nos parques, a palete de cores é, também ela, bem menos viva face à intensidade dos tons adquiridos no ano anterior.


10.03.22


17.03.23


Apesar deste atraso na maturação do arvoredo e dos aguaceiros caídos ainda recentemente, com intensidade suficiente para toldarem as cores e as texturas da paisagem ...



... a natureza vai-se assumindo de primaveril, sobretudo pela actividade dos animais selvagens que nela deambulam.


Entre estes, as aves são aquelas criaturas que, na cidade, mais se destacam pelos deslocamentos constantes em busca de proteína e gordura. E têm uma razão de fundo para o fazer: precisam de ganhar energias para a árdua fase da criação, que está já em marcha!

Todas as manhãs, o coro melodioso de diferentes espécies ouve-se ao perto e ao longe, provindo das áreas arborizadas onde as mesmas se encontram emboscadas. 


Além do arrulho das rolas-turcas (Streptopelia decaocto), voando imparáveis de um lado para o outro ...



... do canto aflautado do macho de melro-preto (Turdus merula), que num ápice se lança do seu poleiro para o solo, onde bruscamente captura mais outra lesma...



... e dos gritos roucos da pega-rabuda (Pica pica), que se movimenta em grupo entre os andares mais elevado das copas ...




... há todo um conjunto de pequenos cantores - em estatura, não em cantoria - que alertam para a chegada definitiva da Primavera. 


São muitos, na verdade, aqueles que anunciam a renovação da vida. 

Contudo, há dois (parentes próximos, aliás) que se destacam, de tão insistentes que são. Refira-se, que foi esta insistência canora que lhes valeu também no passado o estatuto de "perseguidos" (numa época em que a "cultura" ornitológica de captura de pássaros para gaiola era uma actividade praticada de forma intensiva) .


Um deles, como que possuindo um motor contínuo no seu aparelho fonador, canta, canta, canta, quase sem parar, pois de facto, as interrupções são curtíssimas. 

Entre os variados nomes vernáculos de que o baptizaram aquele que se ajusta na perfeição é o de chamariz. Cientificamente, Serinus serinus.


Embora poisado no alto das árvores é impossível não dar por ele, apesar da sua pequena estatura. Ademais, em cada hectare há vários a reclamarem a nossa atenção ... mesmo quando descem ao solo para se alimentarem.





O outro arauto primaveril, que andou fugido com o frio por outros habitats mais aconchegantes, aproxima-se agora do meio urbano, assinalando com a sua vivacidade e regularidade este início de temporada

Mais tímido e mais desconfiado perante a proximidade do homem, eis o encantador verdilhão (Carduelis chloris). 




Qualquer perturbação o atira para fora do seu poiso...



... mas voltando passado algum tempo, pois aquele poleiro, bem lá no alto, é demasiadamente apetecível. 


Chegado e acomodado na ramagem ainda despida, não perde tempo em lançar os seus belos trinados, como que a saudar a manhã ... bom dia Primavera!





sábado, 4 de março de 2023

Desertos verdes





A mata atlântica portuguesa, que reveste toda a região litoral desde o Minho ao Ribatejo, é dominada por povoamentos de pinheiro-bravo (Pinus pinaster). Esta árvore, autóctone no sudoeste da Europa, começou por surgir de forma natural, embora nos dias de hoje a sua existência se deva essencialmente ao resultado de sucessivas plantações, que acabaram por atingir o território mais interior do país.




Desde tempos recuados que as matas de pinheiro-bravo (ou marítimo, como também é conhecido por motivos fitogeográficos) se foram implantando com o intuito de fixação das areias arrastadas pelas nortadas, predominantes na costa norte portuguesa.




Por esta razão, pela madeira e demais essências que essas árvores fornecem, os pinhais fazem parte da memória colectiva das sucessivas gerações de povos costeiros.


 


Disseminadas nestas monoculturas de pinheiro-bravo podem surgir, de forma mais ou menos localizada, outras espécies arbóreas, como o pinheiro-manso (Pinus pinea), o carvalho-alvarinho (Quercus robur), o amieiro (Alnus glutinosa), o loureiro (Laurus nobilis), o sabugueiro (Sambucus nigra), o ulmeiro (Ulmus minor), o medronheiro (Arbutus unedo), etc.



No estrato inferior dos pinhais atlânticos surgem comunidades arbustivas de tojo-arnal (Ulex europaeus), sanganho-manso (Cistus salviifolius), gilbardeira (Ruscus aculeatus), queiró (Calluna vulgaris), camarinheira (Corema album), etc.





Contudo, desde meados do século XIX, a mata atlântica viria a sofrer uma drástica transformação no seu equilíbrio natural, com consequente perda da sua biodiversidade, pela plantação maciça de eucalipto (Eucalyptus globulus), espécie originária da Oceania, muito adaptável às condições do meio e do clima português mas grande sugadoira de água dos lençóis freáticos. 




Um verdadeiro desastre ecológico trazido por esta espécie invasora, sobre a qual nunca foi definido qualquer plano de erradicação dada a profícua rentabilidade da sua exploração para a indústria de produção de pasta de papel. 



As áreas para eucaliptal passaram a retirar protagonismo às áreas de pinhal e frequentemente as duas espécies passam a viver associadas.




Como se não bastasse a adulteração do coberto atlântico com a intromissão do eucalipto, desde finais do século XIX começa a colonização extensiva do território com algumas outras espécies exóticas, também elas provenientes da Oceania, as quais rapidamente se transformaram em terríveis invasoras. 

Acácias (Acacia sp.)!

 




Os pinhais são, então hoje, uma mancha arbórea completamente adulterada, que em anos recentes mais adulterada ficou com a invasão da sul-americana erva-das-pampas (Cortaderia selloana)!





(continua)