sexta-feira, 26 de abril de 2024

A cegonha-branca (II)

 



(continuação)



Estamos em finais de Março.

O arvoredo dos jardins, bosques e bosquetes, vestido com múltiplos tons de verde, já consegue oferecer aconchego aos ninhos e às aves.



As mais altas infra-estruturas humanas, as mais apetecíveis para a cegonha-branca (Ciconia ciconia), vão sendo ocupadas pela espécie.



Construído o ninho ou sobretudo quando este ainda se encontra em fase de construção, é vulgar o casal nidificante ser alvo de investidas por parte de outros casais, no sentido daqueles o abandonarem.



Ultrapassadas estas lutas de demarcação territorial, o casal entrega-se ao cerimonial reprodutor. Este passa por frequentes cópulas ...



... e por rituais de acentuada extroversão.


Posicionados lado a lado, os membros do casal executam, numa primeira fase, movimentos da cabeça e do corpo, para diante e para baixo.



Passado algum tempo estes rituais atingem o seu clímax. Curvando os pescoços para trás, com as cabeças a tocar os dorsos, iniciam um inconfundível e sonante matraquear de bicos. Parecem, com este comportamento repetido amiúde ao longo do dia, estarem a fazer juras de amor. 



glotorar da cegonha-branca - que também acontece sempre que se verifica a chegada de um dos elementos do casal ao ninho - ecoando nos campos ou nos aglomerados humanos, é uma verdadeira imagem de marca da estação primaveril, que está agora a começar.


Será neste período de excitação conjugal que a fêmea começará a realizar a sua única postura, de três a cinco ovos brancos, entre finais de Março e princípios de Abril, os quais irão ser incubados por ambos os cônjuges. 



Decorridos entre trinta e trinta e quatro dias após a postura do primeiro ovo começam a nascer as crias, com um intervalo de pelo menos dois dias - período igual ao que se verificou durante a postura. 

Passadas poucas horas após o nascimento, as crias começam a movimentar a cabeça, parecendo imitar os progenitores quando estão a glotorar.




(continua)


sábado, 20 de abril de 2024

A cegonha-branca

 




Associada na cultura popular à chegada de novas vidas é por essa razão o símbolo icónico da Primavera, a estação do rejuvenescimento da vida

A cegonha-branca (Ciconia ciconia) é uma das aves melhor conhecidas, não só pela sua imponente envergadura, de cera de dois metros, que em voo ainda mais sobressai, mas também, pelos seus comportamentos reprodutivos, que nos deixam apreciar, bem de perto, as suas vidas familiares.




Outrora, começavam a chegar da África sub-tropical, onde passavam o Inverno, logo pelo início do ano. Actualmente, esse movimento migratório ainda acontece mas, devido ao aquecimento global da atmosfera, muitas das aves nem chegam a passar o estreito de Gibraltar dispersando-se pelo sul do país.




Quando chegam à Península Ibérica, estas aves dirigem-se às zonas onde nasceram e onde anualmente nidificam. Os casais formados anteriormente, reencontram-se para mais uma vez procriarem, salvo se algum dos cônjuges não retorna e o outro membro do casal se vê obrigado a arranjar novo parceiro ou parceira.

Os machos parecem chegar primeiro aos locais de criação e alguns dias depois chegam as fêmeas. Ambos, procedem de imediato à reconstrução do velho ninho, desgastado pelas intempéries invernais ou à construção de um novo ninho, caso o antigo tenha caído. É, então, possível apreciar as constantes viagens das aves, a maioria das vezes os machos, transportando gravetos, ramos e ervas, para fabrico dos ninhos, atapetados posteriormente com penas, terra e musgos. 




Com o material trazido para o ninho, a fêmea a maior parte das vezes, procede à construção do ninho novo ou à reconstrução do antigo. 



No caso de ninhos reconstruídos a envergadura dos mesmos pode ser bastante grande, ultrapassando a meia centena de quilos.



Há meio século atrás a cegonha-branca não nidificava na região aveirense, razão pela qual se começaram a instalar plataformas metálicas em postes de energia desactivados, no sentido de atrair estas aves a assentarem ninho. 

Graças a esse esforço, a região alberga na actualidade uma elevada densidade de ninhos.




A cegonha-branca sempre se revelou uma boa vizinha do homem, nidificando em árvores, ...



... nos campanários de igrejas, ...



... em postes ...



... ou em variadas estruturas localizadas em aldeias, vilas ou até cidades.




A localização dos ninhos de cegonha-branca pode ocorrer de forma isolada, como em situações já aqui documentadas ou em colónia.





(continua)



sexta-feira, 12 de abril de 2024

Degelo glaciar: os glaciares de montanha

 







(continuação)


Segundo a Worldwatch Institute os principais glaciares de montanha em todo o mundo estão a sofrer grandes reduções na massa de gelo e neve. 


Nos Alpes e desde meados do século XIX que as temperaturas subiram 2.ºC (mais do dobro da subida média global). Como consequência, os glaciares dos Alpes sofreram uma diminuição de 35% na sua extensão. O terceiro maior glaciar desta cadeia, conhecido como "mar de gelo", localizado nas proximidades do Monte Branco, perdeu no último século mais de um quarto da sua espessura, tendo sofrido um recuo de cerca de dois quilómetros. 


Segundo a Comissão Suíça para a Observação da Criosfera (Academia Suíça das Ciências), o volume de gelo dos glaciares suíços diminuiu 10% nos últimos dois anos, tanto como, durante três décadas (1960-1990), com perdas de espessura que atingiram os 3 metros.


A continuar o ritmo de aquecimento, não só o Mar de Gelo, como outros glaciares, poderão desaparecer na totalidade.


A UNESCO avisa que os glaciares dos Pirinéus, Quilimanjaro e Yellowstone podem desaparecer no intervalo de duas décadas. Mas o recuo glaciar também já é visível noutras regiões do globo, como no Alasca e no Evereste.


A redução do período de nevadas em mais de um mês tem implicações directas na redução da extensão dos glaciares de montanha. E esta redução na superfície branca faz diminuir a área reflectora da radiação solar agravando o degelo dos mesmos. 

Com a redução da extensão de gelo também aumenta a exposição do solo montanhoso e consequentemente a instabilidade do mesmo, com o aumento de deslizamentos.




No continente asiático, o degelo glaciar pode, também, vir a produzir situações de grande dramatismo. 

Há estudos que mostram que no último milénio sempre que ocorriam aumentos significativos nos caudais dos rios tibetanos, havia uma explosão demográfica em todo o território do sudeste da Ásia. 

Esta relação parece explicar-se pelo facto dos rios, alimentados pelos glaciares do Tibete, constituírem a principal fonte de irrigação de todas estas terras, nomeadamente no que respeita à produção de arroz, bem como, fonte de produção piscícola.

Ora, o degelo crescente destes glaciares poderá provocar novos períodos de grandes cheias, que conduzam a um aumento na capacidade de irrigação dos solos, à melhoria das condições sócio-económicas, ao aumento das populações e consequentemente a um crescimento nos consumos de água doce. Água que se vai escapando, perigosamente, destes grandes e insubstituíveis reservatórios naturais!


(continua)



sexta-feira, 5 de abril de 2024

Degelo glaciar: a Antárctida






(continuação)


A Antártida - o continente gelado - perdeu, desde 1940 até aos dias de hoje, cerca de 3 mil quilómetros quadrados de superfície, em consequência da subida de 0,5 °C na temperatura média.

Pelo terceiro ano consecutivo, a extensão de gelo marinho neste continente atingiu níveis nunca antes (desde 1979 até 2022) registados: uma área inferior a 2 milhões de quilómetros quadrados.


Este aumento dos valores da temperatura, acompanhado por um anormal prolongamento em cerca de um mês em algumas zonas, do período de degelo no Verão, tem afectado não só, a extensão gelada deste continente, como também, as espécies animais que aqui vivem. Um dos exemplos é a redução em 33% da população de pinguins-imperadores. (1)


Adventure Life


Outra consequência deste aumento de temperatura sobre as espécies animais nativas da Antárctida diz respeito à chegada de vírus perigosos, como o H5N1 (gripe das aves) já detectado em aves necrófagas (skuas) e que poderão destruir as colónias de outras aves marinhas nidificantes neste continente.

Segundo um outro estudo (2) das 162 plataformas de gelo da Antárctida, 71 perderam massa e destas, 48 diminuíram pelo menos 30% da sua massa.


A situação do continente gelado é gravíssima. 

E as consequências dos seus impactos nos ecossistemas ao nível mundial irão ser devastadoras, caso não haja uma alteração drástica das economias mundiais.


Segundo o IPCC (Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas), para se evitar um aumento da temperatura em 3.ºC até ao final do século será necessário uma redução global de 42% das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) até 2030. Isto, porque a desaceleração dos efeitos do aquecimento não é instantânea!

Resta, pois, muito pouco tempo!


(1) Segundo estudos do National Snow and Ice Data Center (NSIDC) dos EUA e da Universidade de Liège (Bélgica)

(2) publicado na revista Science Advances



(continua)



quinta-feira, 28 de março de 2024

A chegada do equinócio (II)

 





(continuação)


O equinócio, chegou entretanto

A temperatura subiu bastante e com ela o ardor da criação. Os parques citadinos são por esta época um verdadeiro palco de aves cantoras, como já se havia constatado.

O melro-preto (Turdus merula) que, como vimos antes, domina estes parques pelo elevado número de indivíduos que os mesmos albergam, cantam incansavelmente desde o crepúsculo matinal até ao crepúsculo nocturno




Este passeriforme, de menor envergadura que as pegas e as rolas, transporta-nos para outras espécies ainda mais pequenas dentro desta mesma ordem ornitológica. 


De facto, as espécies que mais se fazem ouvir, embora de menores dimensões, são capazes de produzir chamamentos muito mais insistentes e regulares.

Cada executante, ao cantar em longos trinados, faz com que a orquestra no seu conjunto produza uma sonoridade contínua no tempo. Isto é sobretudo significativo no despertar da manhã, quando os ruídos da cidade ainda mal ecoam nos ares e as aves acordam com energias redobradas.




Tal como acontece em qualquer festival de música há sempre um palco principal, onde actuam os cabeças de cartaz. Pois, no parque é igual. 

Vamos até lá, para conhecer esses artistas vocais.




Comecemos por um dos primeiros que ousou aparecer. O verdilhão (Chloris chloris), com seu canto enrolado e persistente, não passa despercebido nos altos ramos, apesar de procurar dissimular-se entre as ramagens. 




Nesta altura do ano, o casal já formado, deambula junto para todo o lado, numa partilha de tarefas obrigatórias para quem quer nidificar. Adquirir reservas energéticas e recolher material para a confecção dos ninhos.




Tal como o melro-preto, o verdilhão é um dos primeiros a aparecer pela manhã e um dos últimos a despedir-se pela tardinha, quando esta já pouco iluminada, mandou há algum tempo para o descanso da noite os outros congéneres.  





Outro cantor, exímio em trinados ininterruptos, é o atraente chamariz (Serinus serinus). E, por esta razão, ele tem sempre garantida a presença neste palco principal. 




Tal como acontece com indivíduos de outras espécies, estas aves passarão largos minutos, empoleirados, a cuidar da sua plumagem. 



E também, como se viu com a espécie anterior, macho e fêmea já andam juntos. Afinal de contas, a criação está em marcha para todas as aves.




Pelo palco principal do parque também passam os chapins.

Com um chamamento e um padrão de plumagem únicos, o chapim-real (Parus major) é uma ave encantadora quando, lá bem no alto, se expõe em animadas cantorias.




Se os chapins-reais encantam, os seus parentes chapins-azuis (Cyanistes caeruleus) não lhes ficam atrás, pela suave coloração que apresentam na cabeça, faces e peito. 

Embora se demorem pouco, pois como é apanágio destas pequenas aves, a quietude é coisa que não lhes assiste, os machos deixam no ar algumas sequências de notas pouco intensas mas suficientemente agudas, enquanto as fêmeas se dedicam a acumular reservas de energia para o desgastante período da nidificação. 



Tal como os chapins, também a toutinegra-de-barrete (Sylvia atricapilla) surge por fugazes momentos neste palco principal. Sobretudo as fêmeas vêm à procura dos pequenos insectos e invertebrados que pululam por entre as ramagens, bem como, de material orgânico para a construção dos ninhos.




Tem sido assim, neste palco de cantores de luxo, que o equinócio da Primavera se tem revelado. 

Contudo, as súbitas alterações do clima, que não param de acontecer, apanharam de surpresa toda esta avifauna selvagem, já em plena actividade reprodutora! 


Chuva, sob a forma de intensos aguaceiros, ...



... vento, soprando em rajadas fortes, ...



... e frio, provocado por uma queda acentuada nos valores da temperatura do ar, ...




... estão a constituir um importante teste às capacidades de adaptação destas pequenas e bonitas aves cantoras. 

Apesar da depressão atmosférica estar instalada, a nidificação é para acontecer. Contudo, e para já, o palco principal está vazio!





(continua)


sábado, 23 de março de 2024

A chegada do equinócio

 





Ainda os dias não se conseguem afirmar no que toca às características meteorológicas, alternando entre a impiedade da água e do frio ...



... e a amenidade de algumas matinas solarengas, ...



... e já os migradores mais precoces se deixam observar em evoluções aéreas. 


Desde os últimos dias de Janeiro e sobretudo durante Fevereiro que se começam a intensificar os avistamentos da sempre simpática cegonha-branca (Ciconia ciconia). Dispersa durante o Inverno por latitudes mais agradáveis, começa a regressar às zonas onde nasceu e se quer reproduzir.



À medida que Fevereiro foi avançando, estas alvas e imponentes aves começaram a sobrevoar e a pousar em árvores, postes e demais estruturas, onde se encontram velhos ninhos ou onde potencialmente serão instalados outros tantos novos.




Sem sombra de dúvida que a cegonha-branca abriu, assim, mais uma temporada de pré-reprodução para uma grande número de seres selvagens nos biomas portugueses.



Também nos parques da cidade, desde o alvorecer até ao final da tarde, que o concerto sonoro dos passeriformes foi sendo acompanhado por um corrupio interminável.

Entre as espécies de maior visibilidade, porque mais movimentadas, contaram-se as rolas-turcas (Streptopelia decaoto). Esvoaçando sempre aos pares, de árvore para árvore, não paravam de arrulhar, anunciando com estas animadas paradas nupciais que a criação estará para breve. 



Também as pegas-rabudas (Pica pica) se destacavam sobre o fundo suave do arvoredo. 



Voando de ramo para ramo, deixavam-se pousar durante pouco tempo ...



... antes de descerem ao solo em busca de alimento, onde com passadas apressadas faziam sobressair o alvi-negro da sua plumagem. As rainhas do parque, em preparativos nupciais.




Mas o concerto pré-primaveril que se foi projectando sobre o dossel do parque ficou a dever-se, sobretudo, à intensa cantoria de outros intervenientes de menores dimensões. 

Entre eles sempre se destacou a cantoria polimórfica do melro-preto (Turdus merula), o rei do parque. Rei, não só pelo seu contributo na animação diária da passarada, mas também, pela quantidade de indivíduos normalmente presentes por metro quadrado de terreno (ou de patamar arbóreo).




Olharemos,  com mais atenção, para esta pequena avifauna.


(continua)