domingo, 3 de janeiro de 2010

2010 - Ano Internacional da Biodiversidade

Em Dezembro de 2006, a Assembleia Geral das Nações Unidas, pela Resolução 61/203, declarou 2010 como sendo o Ano Internacional da Biodiversidade. Com esta decisão, as Nações Unidas pretendiam aumentar as tomadas de consciência mundial, nacional, regional e local, para a importância da Biodiversidade no planeta. Para o efeito contariam com a ajuda dos Estados Membros mais desenvolvidos, os quais poderiam garantir um apoio às acções de sensibilização nos países menos desenvolvidos.

O conceito de Biodiversidade traduz a variedade de formas de vida existentes no planeta Terra. Por conseguinte, este conceito está estreitamente relacionado com a qualidade de vida do homem e em última instância com a continuidade da sua própria existência. Falar da preservação da Biodiversidade implica necessariamente a adopção de um sem número de preocupações com o meio ambiente, tais como sejam a conservação das espécies selvagens e seus habitats naturais, a preservação da qualidade do ar e dos recursos hídricos, o controlo das fontes poluidoras, a exploração racional dos recursos (marinhos, fluviais, florestais, do solo, do subsolo,…), a reciclagem dos lixos e reaproveitamento dos materiais já utilizados, a prática de uma agricultura, de uma caça e de uma pesca sustentáveis, a utilização das energias renováveis em larga escala, o equilíbrio climático do planeta, etc.


À escala mundial

Infelizmente, falar nos dias de hoje de Biodiversidade é falar mais propriamente da sua perda. Uma perda que ocorre a um ritmo galopante. De facto, os padrões de vida das sociedades mais evoluídas, assentes em economias consumistas, caracterizadas pelo gasto desmesurado de recursos naturais não renováveis, bem como por interferências massivas no território natural, têm sido o motor da delapidação da Biodiversidade. Prevê-se que a perda de Biodiversidade como resultado dos padrões economicistas vigentes seja intensificada, uma vez que se espera até 2050 um aumento à escala mundial de mais de dois mil milhões de habitantes.
Também a introdução, deliberada ou acidental, num determinado meio ou região, de espécies invasoras tem sido responsável pela perda da Biodiversidade. É que essas espécies, ao adaptarem-se facilmente aos novos meios, além de afectarem negativamente os habitats, afectam também a fauna e a flora dessas regiões, concorrendo para a sua rápida exterminação. Estima-se que este problema das espécies invasoras se venha a agravar nos próximos anos, como resultado das alterações climáticas, da intensificação do comércio de espécies exóticas e do incremento do turismo.

À escala nacional

De acordo com a legislação europeia sobre esta matéria, foi publicado o Decreto-Lei n.º 565/99, de 21 de Dezembro, que regula a reprodução, comercialização, transporte e introdução de espécies não indígenas em território nacional. Embora desactualizado e em fase de revisão, esse documento apontava à data da sua publicação um valor de 40.1% de espécies invasoras ou de risco ambiental, entre o total de espécies não nativas existentes em território nacional. Deste modo, sem uma inevitável estratégia de erradicação destas espécies, entre as quais se destacam as acácias (Acacia sp.), o chorão (Carpobrotus edulis) e o jacinto-de-água (Eichhornia crassipes), continuaremos a ter, respectivamente, as nossas florestas, as nossas dunas litorais e os nossos lagos e rios descaracterizados e com perda da vegetação nativa.
As intervenções ilegais de privados em terrenos protegidos, com alteração de habitats e/ou destruição de espécies naturais, tem acontecido de forma regular e em diferentes zonas do nosso país, incluso em desobediência a interpostas providências cautelares. Pesem embora os esforços das múltiplas associações de defesa do ambiente em denunciar as ilegalidades cometidas em Portugal, a verdade é que, enquanto o peso das penas por incumprimentos das leis ambientais não for superior ao peso da ganância dos especuladores, não haverá qualquer ganho de Biodiversidade, e todas as datas e comemorações alusivas ao tema não passarão de meros fait-divers.
Enquanto Portugal violar Directivas Comunitárias, como aconteceu com a Portaria n.º 345-A/2008, de 30 de Abril (que definiu o calendário venatório 2008/2009, sobrepondo-o ao período de migração pré-nupcial e/ou de reprodução de algumas espécies), contrariando a Directiva das Aves, não haverá esforços reais na preservação da Biodiversidade. Bem pelo contrário!
Apesar da emissão de gases com efeito de estufa ter diminuído 1.2% entre 2007 e 2008 (tomando como referência o ano de 1990), a produção de electricidade a partir de energias renováveis em 2008 foi apenas de 26.7% (e não de 42% como anunciado pelo Governo). Estamos, por isso, muito longe de conseguir cumprir metas ambientais!
Enquanto o Governo deste país tiver como principais preocupações hipotecar o ambiente e o território nacional aos interesses imobiliários e da construção civil, não vamos ter ganhos de Biodiversidade. Enquanto neste país tão pequenino o progresso social dos portugueses for confundido com necessidades de mais aeroportos, mais pontes, mais TGV e auto-estradas, iremos continuar a assistir ao rasgar de mais e mais território, à destruição de zonas de Reserva Ecológica, de zonas de Reserva Agrícola e de áreas com estatuto de protecção prioritárias. Vamos, em suma, ter mais perda de Biodiversidade!
Enquanto não pararmos os incêndios, sejam eles criminosos ou de outra natureza, estaremos a perder Biodiversidade, seguramente. E vemos que anualmente e apesar de mais meios disponíveis para combate ao fogo anunciados pelo Governo, as áreas ardidas têm aumentado significativamente. Isto indica que Portugal não vai pelo caminho certo para a Biodiversidade.


À escala local

Ovar é uma terra pródiga em ecossistemas naturais. Praias, matas, Ria, cursos de água, campos agrícolas, Barrinha de Esmoriz, etc. Em conjunto, estes ecossistemas permitiriam uma enorme Biodiversidade na nossa região, caso os mesmos estivessem submetidos a um correcto plano de gestão.
O litoral vareiro precisa de muita areia, mas só lhe dão pedra; pedra que só o desgasta ainda mais! As matas estão descuidadas e a precisarem de renovação de espécimes; mas as únicas intervenções de que são objecto acontecem aquando de mais desbastes para novas construções! A Ria em Ovar, apesar de estar integrada na Zona de Protecção Especial da Ria de Aveiro (ao abrigo da Directiva Comunitária das Aves), está completamente assoreada e sobre as suas margens não há qualquer plano de compatibilização sustentável entre a riqueza natural existente e as intervenções aí praticadas!O estado da vegetação ripícola, um habitat de extraordinária importância para a fauna, está ao abandono por todo o concelho! A Barrinha de Esmoriz, apesar de estar integrada na Rede Natura 2000 (ao abrigo da Directiva Comunitária Habitats) devido ao seu elevado potencial biológico, não passa de uma lagoa suja e abandonada; eternamente à espera …. Actualmente, prometem-lhe um Polis que ninguém faz ideia concreta do que venha a ser!
Têm vários anos de gaveta algumas das propostas ambientais que poderiam ter beneficiado o estado do ambiente e a Biodiversidade do concelho de Ovar. Podiam… se tivessem sido postas em prática pela Câmara de Ovar. Mas, tal como aconteceu com a ineficácia do Governo Central nesta matéria, a autarquia vareira não fez contar no seu programa de acção a valorização sustentável do Ambiente.
Infelizmente, é um facto adquirido que o município de Ovar não está no grupo da frente em termos ambientais. Não está, seguramente, na vanguarda ambiental, juntamente com aqueles outros concelhos que se empenham pela valorização crescente dos seus recursos naturais. E porque não? Porque, tão-somente, terão estes últimos entendido a primordial necessidade de preservar e melhorar hoje o ambiente, para obter amanhã ganhos em Biodiversidade.


Álvaro Reis
Ovar, 01 de Outubro de 2009
(artigo publicado na revista Reis 2010)

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